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Mostrando postagens de agosto, 2025

Quando a Verdade Vira Estimativa — E a Estimativa Vira Propaganda: A Era da Pós-planilha!

Não é de hoje que eu desconfio de quem fala de economia com euforia. Já me acostumei com as manchetes de milagre e com os telejornais que abrem com “PIB cresce acima do esperado” como se o esperado fosse um mantra divino, e não uma média aritmética feita por analistas com excesso de café e escassez de dúvida. Mas nos últimos tempos, minha cara leitora, meu caro leitor, até mesmo essa previsibilidade pueril ganhou um ar de teatro trágico. Os números continuam saindo das planilhas, é verdade, mas agora saem trêmulos, com medo de apanhar no corredor. A estatística, antes austera e meticulosa, virou personagem de novela das seis: pressionada, silenciada e, em alguns casos, substituída por versões mais “palatáveis” para o gosto do chefe do dia. Vivemos a era da pós-planilha. Aquela em que os dados não servem para entender a realidade, mas para justificar o roteiro. Verdade sob demanda e Excel com censura Imagine um mundo onde a inflação só existe se você admitir que pagou mais caro na f...

Um Milhão de Motivos para Parar de Desejar Um Milhão

Você já desejou um milhão em dinheiro? Aposto que sim. Quem nunca? Esse número redondo, simbólico, mágico e de sonoridade quase hipnótica virou a nova estrela-guia da salvação financeira. “O que te faria feliz?” — pergunta-se nas escolas, nas mesas de bar, nos consultórios e nos reels de autoajuda. E a resposta vem unânime, quase litúrgica: “Um milhão na conta”. Mas paremos por aqui. Não para julgar, mas para entender. Desejar um milhão não é crime. É sintoma. Sintoma de um país onde o plano de aposentadoria atende pelo nome de “esperança” e a liberdade financeira parece habitar um condomínio fechado com portaria que só reconhece CPF com sobrenome aristocrático. O problema não é desejar um milhão. O problema é achar que ele, sozinho, resolve alguma coisa. O Fetiche do Número Redondo Um milhão. Um milhão! A cifra que parece promessa e milagre ao mesmo tempo. Só que não. Porque, sejamos honestos: num país em que o botijão de gás já esta na casa dos três dígitos e o convênio médico ...

Grosseria é o Novo 'Pretinho Básico' nos Negócios: O mercado adora quem bate com classe, mesmo quando o conteúdo é zero

Já faz algum tempo que o mau humor virou item de luxo. Acessório de poder. Cravou assento na primeira classe do discurso, cruzou as pernas e pediu café sem açúcar — afinal, doçura seria um colapso de reputação. Nas salas de reunião, nos grupos de investidores e nos palcos das redes sociais, a acidez virou moeda. E das mais valorizadas. Não se admira mais quem explica com paciência: admira-se quem “lacra” com velocidade. A verdade, coitada, não precisa mais de argumentos — basta uma resposta curta, atravessada e com sotaque de desprezo. Não precisa fazer sentido. Precisa humilhar com estilo. Gente fina, elegante e sincera? Lamento, mas saiu de moda. Hoje, o que se cultua é a figura do executivo sarcástico, do analista que responde com monossílabos, da coach que grita. Pessoas com “inteligência verbal” que confundem cinismo com insight. Que acreditam que a grosseria dá lastro à credibilidade. Como se ser cruel fosse a versão emocional do “skin in the game”. O problema — e ele é gran...

Convite Secreto, Torta Crescente e os Acionistas Sonâmbulos: Uma aula de subscrição para quem ainda acha que crescer não engorda a conta

Dizem que quem parte o pão com você não necessariamente dividirá os lucros. Pois bem: sentemos à mesa. Imagine que você é sócio de uma confeitaria que, além de bons doces, gera lucro de verdade. Não é dessas vitrines de vidro fosco que exalam glamour e queimam caixa. É negócio de verdade, com receita que entra, despesa que cabe no prato e lucro que, mesmo discreto, sabe fazer travesseiro de dividendos. Mas, como em toda boa receita, há um momento em que se propõe: “Vamos fazer a torta crescer.” E é aqui que entra o tema de hoje — a tão subestimada, mal interpretada e frequentemente ignorada subscrição de ações . Sim, é isso mesmo: o convite elegante e silencioso que a empresa envia aos seus sócios para continuar dançando na pista sem perder o ritmo. Mas como tudo que vem com selo de discrição no mundo financeiro, esse convite costuma ser ignorado por quem prefere a luz da alta das cotações à sombra dos fundamentos. Quando a torta cresce, sua fatia pode encolher Subscrição é, em es...

A Escola Prometeu um Futuro — E Entregou um Ponto Facultativo (por que o aprendizado virou linha de produção e o diploma, atestado de obediência estilizada?)

Dizem que a escola é o lugar onde tudo começa. Discordo. A escola, como temos hoje, é o lugar onde tudo se interrompe. É lá que se aprende a silenciar a pergunta, decorar a resposta e fingir que entendeu. O saber vira escada, mas com degraus de papelão molhado. E, no topo, há um diploma — que, com sorte, serve como QR code para um crachá provisório e, com azar, como enfeite plastificado no fundo de um currículo digital que ninguém lê. Mas vamos por partes. Não é que eu desgoste da ideia de escola. Muito pelo contrário: sou apaixonada pela possibilidade de aprender, de ensinar, de trocar. O problema é que transformaram a possibilidade em protocolo. E protocolo, como todo investidor ou investidora já percebeu, é aquele documento que explica por que a empresa afundou — só que com gramática impecável. A escola que conhecemos hoje não educa: ela certifica. Carimba o “concluído” sem jamais perguntar se foi compreendido. É um rito de passagem onde não há travessia, apenas a travessura de si...

O Futuro É Um Lugar Superestimado onde a Previsibilidade é um Palavrão.

Sabe aquele tipo de pessoa que começa o dia tomando um suco verde batido com espirulina, faz day trade de emoções às 9h30 e, ao meio-dia, já está no LinkedIn garantindo que a “inteligência artificial vai mudar tudo”? Pois bem. Hoje, este texto é pra exatamente o oposto dessa turma. E, se você não entendeu, talvez precise mesmo dele. Vamos falar de previsibilidade. Aquela palavrinha meio sem graça que os especialistas digitais fazem de tudo pra evitar, afinal, ela não rende clique, não vira corte de podcast, e — o mais imperdoável — não dá pra usar junto com “disrupção” na mesma frase. Mas previsibilidade, meu bem, é o nome que o dinheiro dá para a paz de espírito. Porque enquanto você se distrai tentando entender o metaverso ou se pergunta se a sua geladeira vai começar a comprar manteiga sozinha pela blockchain, tem gente enriquecendo com chocolate, sofá e barbeador. Sim, barbeador. A lâmina, não a startup. E esse é o ponto. A Ilusão da Mudança Como Virtude Vivemos numa era em que...

Dinheiro parado não fede — só se você não souber onde encostar.

Você já tentou guardar dinheiro embaixo do colchão e, ao levantar de madrugada, foi atacado por uma traça comunista de olho na sua reserva de emergência? Não? Pois é mais ou menos assim que o mercado trata quem ousa ter dinheiro parado, esperando o momento certo. “Dinheiro parado é dinheiro morto”, dizem os pregadores do evangelho da rentabilidade. Mas cá entre nós: é melhor um morto bem enterrado do que um vivo fazendo besteira no mercado de curto prazo. A urgência de rentabilizar cada centavo virou um mandamento moderno — e, como todo mandamento mal interpretado, produz mártires. Gente que transforma R$10 mil em R$3 mil com a mesma alegria com que frita um pastel: rápida, barulhenta e sem olhar o recheio. Mas há quem prefira outra abordagem. Gente que não troca sossego por rentabilidade com três casas decimais. Gente que entendeu que segurança não é covardia, é estratégia — e que caixa não é preguiça, é dignidade. Sim, estamos falando da velha e pouco glamourosa arte de manter o c...

Especulou, Tomou: O Prazer Fugaz da Riqueza Instantânea (E o B.O. Que Vem Depois)

Eu sempre achei curioso como a palavra “especulação” soa elegante. Quase aristocrática, como se fosse dita com um copo de conhaque na mão e um brasão de família bordado no colete. Especular. Um verbo que parece vir de Versalhes, mas que, na prática, mais se parece com um joguinho de roleta russa jogado no porão de um cassino clandestino, onde a casa sempre vence — e você, quase sempre, perde até o cinto da calça. Especular é o hobby moderno de quem tem pouco tempo, muito ego e nenhuma paciência. É a erotização financeira da era digital: prazerosa, solitária e absolutamente inútil no longo prazo. Mas, ah... como seduz. Porque especular não exige estudo sério, nem estratégia duradoura — só exige uma conexão boa de internet, alguns aplicativos com gráficos piscando e a ilusão de que você é mais esperto que o mercado. Spoiler: você não é. O fetiche do “dinheiro rápido” Há um apetite insaciável por atalhos. Talvez porque nosso século seja o primeiro a prometer felicidade em tempo real, e...

A Preguiça Está Em Alta — E o Esforço, em Liquidação (Como Vencer no Século da Preguiça Quando Pensar Vira Ativismo e Estudar Vira Revolução)

Provocação:  No supermercado do comportamento, o cérebro virou freguês do prazer imediato — e o pensamento racional saiu de férias (sem previsão de volta) Se você chegou até aqui, parabéns. Já percorreu mais palavras do que boa parte da humanidade aceita digerir sem açúcar, sem meme e sem emoji. Não estranhe se o cérebro chiar: leitura prolongada, hoje em dia, é quase uma dieta de guerra. Há quem diga que estamos mais informados do que nunca. Pode ser. Mas informação não é vacina contra burrice — tampouco contra compulsão. Aliás, em tempos de vigilância hiperdopaminada, saber o certo e fazer o oposto se tornou o novo normal. Não por maldade, nem por ignorância. Mas por covardia bioquímica. Somos criaturas sofisticadas com hábitos de lagartixa. Racionais só quando o neocórtex está disposto — o que, sejamos honestas, anda raro. A verdade? Ninguém mais quer pensar. Pensar cansa, pesa, demora. Dá sede e, pior, não viraliza. O Cérebro Adestrado Imaginem um cérebro dividido em trê...

O Investidor que Acreditava Demais (e Outras Fábulas de Mercado)

Todo investidor nasce otimista — senão com o mundo, ao menos consigo mesmo. Compra ações achando que está comprando sabedoria, e se enche de planilhas, livros coloridos e termos em inglês como se o futuro dependesse disso. E depende, só que de um jeito mais irônico do que ele imagina. No mercado financeiro, o exagero é um esporte olímpico. Tem gente que acha que todo número publicado em relatório trimestral é uma epifania; outros que acreditam que descobriram uma fórmula nova que ninguém mais viu — como se a inteligência tivesse feito escala exclusiva na sua corretora. A verdade é mais parecida com aquela piada triste de elevador corporativo: todos estão subindo, mas ninguém sabe exatamente até quando. 1. O Mercado, Esse Espelho de Circo Vamos começar pelo básico. O mercado não é uma orquídea exótica a ser decifrada por botânicos com MBA. Ele é uma feira livre — barulhento, instável, regido por gritos, cheiro de banana madura e boatos sobre o preço do tomate. A cada esquina aparece ...

Errar o Caminho Ensina Mais do que o Destino: Quem só segue o mapa, perde a geografia dos erros que enriquecem.

Nunca fui fã de roteiros turísticos — esses manuais sentimentais que tentam dar conta do imprevisto com planilhas coloridas, reservas antecipadas e esperanças inflacionadas. Preferi sempre uma pitao caos com alguma bússola. E isso vale para viagens, para a vida — e principalmente para investimentos. Planejamento? Sim. Mas com modéstia. Aquelas pessoas que montam Excel com horário de pôr-do-sol e cotação do dólar paralelo para cada bairro que pretendem visitar são, em geral, as mesmas que sofrem três colapsos nervosos quando o voo atrasa. São também, com frequência, as que desistem de investir após o primeiro tropeço do Ibovespa, como quem abandona o cruzeiro porque choveu no segundo dia. Não é o imprevisto que arruína o trajeto. É a expectativa domesticada. Se a viagem perfeita não rende crônica, o investimento imaculado também não rende sabedoria. O Estranho Conforto do Desvio Você começa achando que vai para São Caetano — mas descobre tarde demais que era o do Sul , e não o de O...