Selic em Dois Dígitos enquanto Patrimônio se Arrasta: Testando Nossa Fé no "BEST’S ME"

Imagine a cena: a Selic está firmemente ancorada nos 15% ao ano, a Bolsa bateu 141 mil pontos em julho, mas os setores do BEST’S ME — Bancos, Energia, Seguros, Telecom, Saneamento e Materiais Essenciais — vivem dias de tédio ou até fraquejam. Todos imersos em uma história que soa familiar: “com juros altos não dá pra investir em Bolsa”. Será mesmo?

Neste momento, nossa fé no investimento em boas empresas – daquelas com gestão honesta, foco no pequeno investidor e um histórico decente de pagamento de dividendos – é colocada em cheque. Vamos refletir sobre esse teste, com a elegância, sarcasmo e a chamada lucidez ácida do “Dinheiro Que Me Veja”.

Selic a 15%: a ilusão da segurança

Juros no patamar que não se via desde 2006. O Banco Central reinvestindo a Selic para controlar a inflação, enquanto quem está de olho no mercado de renda variável vê seu caixa rendendo mais sem apertar nenhum botão. Quem diria: a própria economia transformando o investidor de longo prazo em entusiasta da renda fixa. Mas cuidado: esse conforto imediato pode se transformar em armadilha.

O conforto traiçoeiro do rendimento fácil

Ter dinheiro rendendo 15% ao ano enquanto a inflação cai é doce, quase sedutor. Mas a pergunta é: queremos refrigerante todos os dias, ou suco concentrado com propósito?

A renda fixa é a prateleira de emergência: sábia, prudente, mas previsível (e, sejamos sinceros, entediante). Os melhores momentos para aquisição de ativos não são quando o rendimento está nas nuvens — são quando o mercado te vende barato e você tem coragem de comprar.

Bolsa: festa chegue cedo, levanta cedo

A Bolsa brasileira, depois de tocar 141 mil, sustenta pregões consecutivos de queda — uma queda de 4,3% desde o pico. Isso faria muitos investidores correrem para os braços sedutores da renda fixa — mas o investidor raiz sabe: é justamente aí que mora a hipótese do acaso.

Juros altos não matam dividendos consistentes

Empresas do BEST’S ME continuam pagando dividendos — embora a distribuição não suba como foguete em bonança. O yield segue satisfatório, mas a cotação dorme. Isso não é sinal de falha, é chamado margem de segurança.

O que estamos vendo é o efeito da Selic elevando a referência de retorno sem esforço, o que pressiona o preço das ações. No entanto, os resultados operacionais continuam — e continuarão — entregando lucro. Se compradas a bom preço, essas empresas ainda fazem sentido como pilar de carteira sólida.

Reforçando a fé (enquanto a Selic ferve)

Compra com margem de segurança

O mantra do investidor sofisticado é: vertical on price, horizontal on convictions. Ou seja, concentre suas compras em patamares de preço que ofereçam segurança se o cenário der errado — e diversifique, mas não espalhe demais.

Juros altos não alteram o lucro futuro dessas empresas. E mais: reduzem a concorrência no mercado, pois muitos ficam à mercê da renda fixa. Raras vezes a gente encontra resenha tão propícia para buscar barganhas nos setores essenciais.

Juros são companhia, não fuga

A renda fixa deve ser vista como parte do sistema, não seu destino. A reserva de oportunidade, o caixa, a salvaguarda — mas dentro de um plano que contempla a ação. Quem tem eleição correta nos setores BEST’S ME, com histórico de dividendos, pode se manter firme e, quem sabe, comprar durante os mergulhos ocasionais da bolsa.

Para citar com licença budista: ficar parado enquanto o mercado flutua é muito diferente de não fazer nada. É aprendizado, mastigação, construção de crença. No futuro, esse silêncio estratégico é a fagulha da consistência. (Se eu ainda não escrevi sobre isso, farei posts a respeito).

Testando a fé com Selic alta

Quantos dos que começaram por volta de 2018 já viram seus dividendos dobrar, triplicar? A taxa Selic caiu, a Bolsa subiu, o yield potencial aumentou. Hoje, com juros elevados, estamos sendo convocados a provar nossa coragem e paciência.

O momento é de calibração emocional

Um investidor raiz conhece o ciclo: é fácil confiar quando tudo sobe; é teste quando tudo segue lateral ou cai. Por isso, desde 2013 enfrentamos várias tempestades — recessão, impeachment etc. E foi nesses momentos que construímos verdadeira convicção.

Hoje passamos por algo semelhante: juros altos testam a consistência. Sobreviver na firmeza, sem piscar, sem trocar a metodologia pelo calor do medo, é o que distingue quem faz gestão com propósito.

O que a história nos diz

Anos de crise provocaram valorização expressiva dos ativos. Por outro lado, períodos com correlações altas trouxeram retornos longos e polpudos.

Desde 2022, Selic subiu quase 800 pontos base até 15%. Desde maio, o Ibovespa atingiu 140 mil, mas "despencou" para 135 mil. O que nos lembra: melhor pregão geralmente vem logo depois do pior. A história recente da Bolsa está aí para provar — e quem estava dentro se beneficiou.

Fazendo o que importa

Diante da montanha de juros altos:

• Mantenha seu foco nos fundamentos: gestão, fluidez de caixa, dividendos previsíveis.
• Evite reações dramáticas: não desembarque da Bolsa por causa do rendimento fácil da renda fixa. Ela é ambientadora, não protagonista.
• Use os mergulhos: Selic a 15% te dá caixa para aumentar posições com desconto real.
• Fortaleça a confiança: releia seu plano; reflita, estude, porque esses momentos constroem mentalidade.

Ironia final

Selic altíssima, Bolsa pregando preguiça, rendimentos ao alcance de um clique, reservas a salvo — e ainda falta querer jogar fora tudo e descer o sarrafo. A loucura do "veneno financeiro com verniz" é justamente essa: sorrir, enrolar o pensamento, esperar enquanto muitos perdem a fé.

Na edificação do patrimônio, não há armadilha pior do que profanar o catolicismo da disciplina financeira só porque o crucifixo treme no altar da renda fixa.

Conclusão

Sim, a Selic está em dois dígitos e o mercado testa nossos nervos. Mas também testa nossa lucidez, nossa classe e nossa paciência. O momento é incômodo, porém iluminador: ele não exige que sejamos otimistas, apenas fiéis ao que sabemos. Porque fé, aqui, não é crença cega — é convicção que enxerga além da Selic.

— Ho-kei Dube

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